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domingo, 4 de janeiro de 2015

depois de ler A paixão segundo G.H.

depois de ler o grande livro da Clarice Lispector, escrevi isto
marian pessah

         Confesso. Passei 46 anos sem ter lido um dos melhores livros da vida. A paixão segundo G.H. é uma genialidade tal que tira o sono. Nele, no próprio nome está “oculta” a sua essência.

        Essência essa que levei anos a me aproximar e lê-la. Tentei umas duas vezes e, na terceira, puro vencimento, pura paixão. A barata mudou a minha vida. Ela, suas frases curtas e entrecortadas. Sua genialidade toda. Amo-a. Eu comecei a ler, mas eu gosto de ir devagar. Amor tântrico? Felicidade clandestina? Ela que era a minha amante. Clarice escondida entre suas letras que formavam palavras que uniam ideias que revelavam paixões que anunciavam destinos.  Eu queria, precisava, saber que ela estava ai, perto. Que não acabava. Fazer de conta que não estava, e de pronto, a lia, a via, a escutava. A desfrutava. Esperei uns dez dias para ler os últimos dois capítulos. Queria, precisava, saber que ela estava ai, ainda, cheia de mistérios, de paixões para me revelar. Que eu ainda tinha com quem me rebelar, revoltar, gritar e até, resignificar as palavras amor e paixão. Procura do mistério.

       Mistério. Ela mudou sim coisas em mim. Dias atrás, eu estava sentada no vaso quando uma barata caminhava pela porta. Em outro momento, teria sentido um semi-pánico correndo pelas minhas veias. E não. E não fiz nada. Simplesmente me limitei a sentir a presencia da C.L., ou da G.H.? Algo kafkiano? Pode até ser. Mas eu fiquei fazendo xixi como se nada acontecesse. Não! Como se nada não. A CL estava junto no banheiro. Ela caminhava pela parede. Eu sei por que a observava. Ela caminhava e de pronto, parou para me olhar. Meu xixi acabou. Faço o quê?

        O quê era o ponto em questão. Será que era o Gregor quem desejara entrar ao banheiro e eu estava atrapalhando-o? O ponto é que a CL conseguiu extirpar de mim aquele desconforto absurdo que outrora eu teria tido. E já não em sentir, nem sinto, saudades. Eu queria mais é conversar com a barata. Uma vez a minha mãe me contou que estava sozinha na casa e se encontrou com uma aranha. Enorme. Ela falou assim: “Prezada aranha, eu não te farei nada e tu não me farás nada, pode ser?”. E assim a Dona Alicia se acalmou.

        Acalmou a situação e eu, simplesmente, fiquei a olhar a barata. Porém, quando sai, vi uma outra voando. Aí foi que pensei na liberdade, nas asas. Os espaços, os espasmos, a vida, as vidas, o mundo o ser. O inerente do ser ao estar. Consentir.


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