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sábado, 9 de agosto de 2008

RELACIONAMENTOS ABERTOS

Do pessoal ao político - revolução cotidiana e libertária

Por Clarisse Chiappini Castilhos[1]

Clarisse Castilhos
Primeiramente em língua brasileira

Estas são livres reflexões sobre a dimensão política de vivências pessoais. Pretendo aqui contribuir para levar adiante aquela discussão tão essencial – e tão difícil: o aprofundamento do significado político / pessoal dos relacionamentos abertos[2]. Mais ainda, conversar sobre a vivência cotidiana dessa luta.
Essa proposta de discussão tem base em longas conversas com mariana pessah, bem como outras amigas e companheiras.


um pouquinho de his-tória e hers-tória ...

Gostaria de me apresentar como uma pós-hippie, pós-68, ainda-feminista, ainda-esquerdista, marxista com pitadas de anarkismo, tentando encontrar um espaço nesse mundo estupidamente dominado pelo estúpido pensamento pós-moderno e neo-liberal. Por isso não abandono o debate tão vivo nos anos 70 sobre “monogamia” - um tema central nas lutas libertárias e intimamente relacionado à idéia de “relações abertas”.

O próprio marxismo nos mostra que a família monogâmica se formou para garantir a transmissão da herança gerada pela acumulação de excedente (Engels). Esse pensamento nos leva também a concluir que o núcleo familiar monogâmico patriarcal, definiu rigorosamente o papel exercido pelo homem e pela mulher, papéis esses que sempre colocaram o homem na esfera do poder.

No capitalismo, essa estrutura caiu como uma luva, favorecendo nitidamente a reprodução do capital através da ampliação da mais valia. De que forma? Dentre outras sutilezas, porque a ação das mulheres nesse micro sistema contribuiu, e contribui, para a redução do custo de reprodução da mão-de-obra e assim para o pagamento de menores salários à classe operária. A “fada do lar” zela pela alimentação, segurança, educação e bem-estar da família. Isso tudo sem cobrar nada. Se agregarmos o fato de que hoje a maioria das mulheres está engajada no mercado de trabalho, exercendo duplas ou triplas jornadas, e ainda sendo pior remunerada do que os homens, podemos formar um panorama mais completo do papel das mulheres no sistema. Essa estrutura de funcionamento tem uma base material: transmissão da herança e redução do custo de reprodução da força de trabalho.

No entanto, o que hoje mais assegura a manutenção da estrutura familiar monogâmica é sua função ideológica, o seu simbolismo de felicidade, de única forma possível de bem-estar. Essa ideologia – a da família monogâmica feliz - é tão poderosa quanto outras representações sociais como a autoridade patriarcal, como a proteção materna, e de seus macro-equivalentes como o Estado e as instituições. Essas representações são o instrumento mais eficaz para impedir o fim de um sistema econômico que somente se reproduz através da destruição material. É de ressaltar a importância que tem para o capitalismo, em sua fase atual, continuar com a submissão das mulheres, ainda que disfarçada atrás de formas mais sofisticadas.

“O aspecto mais importante da família na manutenção do domínio do capital sobre a sociedade é a perpetuação- e a internalização- do sistema de valores profundamente iníquo, que não permite contestar a autoridade do capital, que determina o que pode ser considerado um rumo aceitável de ação dos indivíduos que querem ser aceitos como normais, em vez de desqualificados por “comportamento não conformista” (Mészáros, 2002,p. 271)

E como se passou no socialismo real? A vanguarda da revolução russa, coerente com a crítica marxista da família, organizou comunas para substituir o núcleo familiar tradicional. Nessa fase temos a pioneira Alexandra Kolontai, com todos os limites próprios a uma pensadora imersa num processo revolucionário. Infelizmente, essa revolução foi logo retomada pelo poder patriarcal e por sua conseqüente rigidez moral. O moralismo capitalista foi transformado em moralismo socialista, cheio de regras e de “patrulhas ideológicas”. Tudo o que era estranho, como o amor entre pessoas do mesmo sexo, era considerado “desvio burguês”. Essa experiência durou pouco e, 90 anos depois, @s russ@s continuam se agregando em famílias monogâmicas, tradicionais e repressoras. Esse exemplo mostra a força da ideologia que mantém as bases de um sistema econômico decadente, mesmo que em forma de farsa, como nos antigos países socialistas. Com isso prolonga sua sobrevida e a nossa agonia.

Quem viveu a luta dos anos 60’/70’ tinha como meta a transformação plena, da economia, da cultura e dos valores. A revolução econômica ligada à revolução sexual. A crítica se estendia do chamado marxismo vulgar (economicismo) à psicologia freudiana (civilização é repressão). A criação de uma nova sociedade não passaria apenas pela coletivização dos meios de produção era necessário criar uma nova ideologia, um novo cotidiano.


a revolução cotidiana e a lesbianidade

Sabemos muito bem para onde o socialismo real / patriarcal, nos conduziu. Conhecemos perfeitamente os efeitos pessoais e sociais do dogmatismo moral da família tradicional. A história da família é a história de repressão da criatividade, da sexualidade e do prazer.
A família nuclear monogâmica servia - e ainda serve - para controlar a libido humana (em particular da mulher); para reprimir seu prazer - principal fonte de imaginação e de criatividade-; para fabricar uma infelicidade que gera silêncio e submissão. Uma submissão necessária à reprodução do capital e do mundo de dominância masculino. O riso, a alegria e a irreverência são obras do demônio e devem ser eliminadas e controladas pela culpa.
Como dizia Jorge, o frei cego do Nome da Rosa, a propósito do segundo livro da poética de Aristóteles
[3]: “(...) O riso libera o aldeão do medo do diabo, porque na festa dos tolos também o diabo aparece pobre e tolo portanto controlável. Mas este livro (o segundo livro da Poética) poderia ensinar que libertar-se do medo do diabo é sabedoria. (...) a lei é imposta pelo medo, cujo verdadeiro nome é temor a Deus. E deste livro poderia partir a fagulha luciferina que atearia no mundo inteiro um novo incêndio (...). (Eco, 2003, p.455) A civilização judaico – cristã - muçulmana é a civilização da repressão e da culpa. Esta é a verdadeira história da humanidade.

a revolução dentro de casa

Até aqui apresentei livres reflexões que podem conter algumas imprecisões, mas são o pano de fundo do debate que proponho retomar em profundidade: as relações abertas na luta cotidiana; o desafio que enfrentamos no dia - dia desde uma perspectiva lésbica- feminista- autônoma e revolucionária.

Vamos partir de algumas constatações:
-Primeira: a pedra fundamental para a manutenção da família hetero monogâmica é a “fidelidade” da mulher.
-Segunda: nas “famílias” lésbicas, a prática não é muito diferente.

É da segunda que quero começar a pensar. No dia-a-dia os relacionamentos lésbicos não se diferenciam radicalmente dos relacionamentos heteros! Mesmo entre aquelas que consideram que ser lésbica é também, e antes de tudo, um ato político. De modo geral, dentro das relações amorosas lésbicas, a materialização dos desejos da outra, a possibilidade de viver novas relações sexo-afetivas - e mesmo apenas afetivas- fora dessa união, são vistas com muita desconfiança e com muito medo. Na maior parte das vezes resulta ou em finalização da união ou na repressão desses impulsos.

De fato, conviver com a perspectiva de mudar essa situação no cotidiano - não somente nas teorias e debates - é uma situação difícil e dolorosa. É como andar no fio da navalha, no limite entre a realização plena para uma e a frustração para a outra. No entanto essa pode ser uma construção solidária muito criativa, prazerosa e, sobretudo, o resgate da nossa alegria humana. Essa é, com certeza, uma das bases da revolução cotidiana e permanente.

A experiência pessoal de quem viveu maio de 68’ e daquelas que continuaram resistindo, foi uma sucessão de tentativas de realizar o desejo de ser livre no corpo e nos pensamentos. Uma luta cotidiana para contrapor-se à acomodação e à sedução de inserção bem comportada proposta pelo capitalismo.

Mais difícil torna-se viver esse sonho no cotidiano de uma relação amorosa, dividindo o dia-a-dia com uma companheira, onde as duas se amem, se desejem e possam criar juntas.
Viver essa situação só pode acontecer dentro de uma base de muita sinceridade que contém a renovação compartilhada dessa revolução cotidiana e permanente. Somente a partir de conversas constantes e solidárias foi possível progredir sobre esse tema, apesar de sua complexidade. Num contexto de liberdade torna-se possível a convivência com novos amores e permite as pessoas envolvidas nessa situação tomar uma via (ou uma transvia) mais verdadeira e mais prazerosa.

As dificuldades são grandes. Do lado de quem está consciente que a sua parceira está envolvida/encantada/apaixonada por outra mulher ocorrem muitas crises de insegurança (de inspiração hetero - patriarcal, é bem verdade, mas nem por isso menos dolorosas). Uma vez que se consegue conviver com esses sentimentos, a superação da sensação de posse (que também não é nada simples) leva a uma libertação dos próprios sentimentos.

O essencial para conviver com essa nova situação é falar tudo dentro do relacionamento. Aquele papo de “só contar quando for algo mais sério” não funciona. É um embuste. Em primeiro lugar, porque está abalando a capacidade de percepção e de conhecimento de uma pela outra:
uma -eu sinto que ela está com outra relação, ou a fim de outra mulher, mas é paranóia... Se eu falar, ela vai se sentir agredida.
outra – Tem sentido falar se talvez termine amanhã?

É possível antecipar ou afirmar os rumos de uma relação aberta ou fechada? Penso que o primeiro passo é que todas as mulheres envolvidas têm que conhecer a verdade. Tudo precisa ficar explicito, mesmo que seja “eu não sei o que vai acontecer a partir de agora...”.

Compreendendo e vivendo esse processo, junto com uma companheira engajada nessa mesma busca, pode-se sentir um profundo sentimento de libertação. Numa situação como essa o ciúme e a posse perdem o sentido (mesmo que sigam existindo). Permanece o medo de “perder” que também é uma possibilidade numa relação monogâmica ou fechada. A possibilidade de esconder os sentimentos que possa (eu também) ter por uma terceira pessoa, também perde o sentido.

Reitero que é necessário muito cuidado com a(s) pessoa(s) amada(s). Vale a pena ser exposta a situações diárias e freqüentes de divisão de privacidade? É essencial preservar a intimidade e a especificidade das relações. Penso que esse convívio constante expõe a pessoa que está tendo outras relações a um stress de tentar “ajustar” as coisas, e as outras duas a muitas oscilações por imaginar coisas que não são ditas, sentimentos que estão sendo reprimidos. Em suma, penso que viver relações paralelas não pode cortar o fluxo de energia entre as pessoas que dela participam.

Como venho defendendo desde o início, a forma de trilhar o caminho do desafio é muita subjetiva. Mas, penso que cada uma deveria encontrar a forma de inserir suas próprias particularidades e individualidades nesse processo. Uma das minhas, é manter minha paz que também é um elemento de criação.


Até onde levaram nossos diálogos...

A prática, desta vez, me levou a acreditar que não tem o menor sentido perder sentimentos tão profundos e tão criativos - e raros - que podem unir duas mulheres, nem esse desejo que sentimos quando estamos bem. Também não tem o menor sentido que cada uma impeça a realização dos mais diversos impulsos criativos da outra. São relações diferentes, com pessoas diferentes. É como se retirássemos um véu que nos separa de nossa essência e que finalmente passássemos a nos ver face a face. Com todas nossas dificuldades e desejos. Enfim mais humanas, mais revolucionárias, com mais força para transformar esse mundo patriarcal, classista e racista. Isso me enche de amor por minha companheira e me dá vontade de ser inteira e plena. Afinal, como dizem @s existencialistas, viver é carência de ser.

Se a revolução social parece uma meta tão distante, ela pode ocorrer dentro de casa, desde que sua dimensão social não se extravie. Na realidade é somente na dialética individual / social que pode se construir um processo revolucionário que seja permanente e representativo dos conflitos que fundamentam todos os movimentos sociais. É a revolução do prazer, da criação e da mais profunda sinceridade.

Com tudo isso, quero deixar expresso que não pretendo escrever nenhum manual sobre relações abertas. Essa é uma experiência subjetiva (mesmo que política) que não tem regras, assim como a sociedade que nós queremos criar e viver desde agora. É parte de nossa revolução cotidiana e libertária.



Referências:

Engels, F. (s.d.) El origen de la família, la propiedad privada y el Estado. Ed. Progresso, Moscú.
Mészáros, I. (2002) Para além do capital. Ed. Boitempo/ Ed. UNICAMP, São Paulo.
Eco, U. (2003) O Nome da Rosa. Ed. O Globo, Rio de Janeiro/ Folha de São Paulo, São Paulo.






ahora en lengua argentina


RELACIONES ABIERTAS[4]


De lo personal a lo político – revolución cotidiana y libertaria
Por Clarisse Chiappini Castilhos
[5]

Estas son libres reflexiones sobre la dimensión política de vivencias personales. Pretendo aquí contribuir para llevar adelante aquella discusión tan esencial – y tan difícil: la profundización del significado político/personal de las relaciones abiertas
[6]. Quiero conversar sobre la vivencia cotidiana que esta lucha nos plantea.
Esta propuesta de discusión tiene base en largas conversaciones con Mariana Pessah, también con otras amigas y compañeras.


un poquito de his-toria y hers-toria ...

Me gustaría presentarme como una post-hippie, post-68’, aun-feminista, aun izquierdista y marxista con pinceladas de anarkismo, intentando encontrar un espacio en este mundo dominado por la idiotez del pensamiento post – moderno y neo-liberal. Por eso no abandono la discusión iniciada en los años 70’sobre monogamia - un tema central en las luchas libertarias e íntimamente relacionado a la idea de relaciones abiertas.

El propio marxismo nos muestra que la familia monogámica se formó para garantizar la transmisión de las herencias generadas por la acumulación de excedente (Engels). Este pensamiento nos lleva también a concluir que el núcleo familiar monogámico patriarcal, definió rigurosamente el papel ejercido por el hombre y por la mujer, roles que siempre lo colocan a él, en la esfera del poder.

En el capitalismo, esta estructura cayó como anillo al dedo, favoreciendo nítidamente la reproducción de la plusvalía. ¿De qué forma? Entre otras sutilezas, la acción de las mujeres en el micro sistema familiar contribuyó y contribuye, a reducir el costo de reproducción de la mano de obra y así para el pago de menores salarios a la clase obrera. El “hada del hogar” cuida de la alimentación, seguridad, educación y bienestar de la familia; todo esto sin recibir un centavo a cambio. Si agregamos también que hoy día, la mayoría de las mujeres está inserida en el mercado de trabajo ejerciendo duplas o triples jornadas, y con el plus de que son peor remunerada que los hombres, esto ayuda a tener un panorama de las mujeres en el sistema. Esta estructura de funcionamiento tiene una base material: transmisión de herencia y reducción de costo de reproducción de la fuerza de trabajo.

Mientras tanto, lo que hoy día ayuda a sostener la manutención de la estructura familiar monogámica es su función ideológica, su simbolismo de felicidad, de única forma posible de bienestar. Esta ideología – la de la familia monogámica feliz - es tan poderosa cuanto otras representaciones sociales como la autoridad patriarcal, como la protección materna, y sus macro-equivalentes como el Estado y las instituciones. Esas representaciones son el instrumento más eficaz para impedir el fin de un sistema económico que solamente se reproduce a través da la destrucción material. Vale destacar la importancia que tiene para el capitalismo, en su fase actual, continuar con la sumisión de las mujeres, aunque ello sea escondiéndola detrás de formas sofisticadas.


“El aspecto más importante de la familia en la manutención del dominio del capital sobre la sociedad es la perpetuación – y la internalización - del sistema de valores profundamente inicuo, que no permite contestar a la autoridad del capital, que determina lo que puede ser considerado un rumbo aceptable de acción de los individuos que quieren ser aceptados como normales, en vez de descalificados por “comportamiento no conformista” (Mészáros, 2002,p. 271)

¿Y cómo sucedió en el socialismo real? la vanguardia de la revolución rusa, coherente con la concepción marxista de la familia, organizó comunas para sustituir el núcleo familiar tradicional. En esta fase tenemos a la pionera Alexandra Kolontai, con todos los límites propios de una pensadora inmersa en un proceso revolucionario. Infelizmente, esta revolución fue pronto retomada por el poder patriarcal y por su consecuente rigidez moral. El moralismo capitalista fue transformado en moralismo socialista, lleno de reglas y de “controles ideológicos”. Todo lo que era extraño, como el amor entre personas del mismo sexo, era considerado “desvío burgués”. Esta experiencia duró poco y, 90 años después, l@s rus@s continúan uniéndose en familias monogámicas, tradicionales y represoras.
Este ejemplo muestra la fuerza de la ideología que mantiene las bases de un sistema económico decadente, mismo que en forma de farsa, como en los antiguos países socialistas, de esta manera prolonga su sobre-vida y nuestra agonía.

Quien vivió la lucha de los años 60’/70’ tenía como meta la transformación plena de la economía, la cultura y los valores; la revolución económica unida a la revolución sexual. La crítica se extendía del llamado marxismo vulgar (economicismo) a la psicología freudiana (civilización es represión). La creación de una nueva sociedad no pasaría apenas por la colectivización de los medios de producción, era necesario crear una nueva ideología, un nuevo cotidiano.


la revolución cotidiana y la lesbianidad

Sabemos muy bien para dónde el socialismo real / patriarcal, nos condujo. Conocemos perfectamente los efectos personales y sociales del dogmatismo moral de la familia tradicional. La historia de la familia es la historia de la represión de la creatividad, de la sexualidad y del placer.
La familia nuclear monogámica servía - y todavía sirve - para controlar la libido humana (en particular de la mujer); para reprimir su placer - principal fuente de imaginación y de creatividad-; para fabricar una infelicidad que genera silencio y sumisión. Sumisión necesaria para la reproducción del capital y del mundo de dominación masculino. La sonrisa, la alegría y la irreverencia son obras del demonio y deben ser eliminadas y controladas por la culpa.
Como decía Jorge, el monje ciego en el Nombre de la Rosa, a propósito del segundo libro de la poética de Aristóteles
[7]: “(...) La risa libera al aldeano del miedo del diablo, porque en la fiesta de los tontos también el diablo aparece pobre y tonto,por lo tanto controlable. Pero este libro (el segundo libro de la Poética) podría enseñar que libertar-se del miedo del diablo es sabiduría. (...) la ley es impuesta por el miedo, cuyo verdadero nombre es temor a Dios. Y de este libro podría partir la chispa luciferina que encendería el mundo entero en un nuevo incendio (...). (Eco, 2003, p.455) La civilización judeo – cristiana- musulmana es la civilización de la represión y la culpa. Esta es la verdadera historia de la humanidad.


la revolución dentro de casa

Hasta aquí presenté libres reflexiones que, si bien pueden tener algunas imprecisiones, son la base del debate que quiero retomar en profundidad: las relaciones abiertas en la lucha cotidiana, el desafío que enfrentamos día a día desde una perspectiva lesbiana-feminista- autónoma y revolucionaria.

Vamos a partir de algunas afirmaciones:
-La primera: la piedra fundamental para la manutención de la familia hétero monogámica es la “fidelidad” de la mujer.
-La segunda: en las “familias lesbianas” la práctica no es muy diferente.

Es a partir de la segunda afirmación que quiero comenzar a pensar. En la práctica del día-día, las relaciones lesbianas no se diferencian radicalmente de las relaciones hétero. Incluso, entre aquellas que consideran que ser lesbiana es también, y ante todo, un acto político. De manera general, dentro de las relaciones amorosas lesbianas, la materialización de los deseos de la otra, la posibilidad de vivir nuevas relaciones sexo-afectivas – y solamente afectivas- fuera de esta unión, son vistas con mucha desconfianza y con mucho miedo. La mayor parte de las veces acaba en el fin de la relación o en la represión de los impulsos.

De hecho, convivir con la perspectiva de cambiar esa situación en lo cotidiano, no solamente en las teorías y debates, es una situación difícil y dolorosa. Es como andar al filo de la navaja, al límite entre la realización plena para una y la frustración para la otra. Mientras tanto, esa puede ser una construcción solidaria muy creativa, placentera y, sobretodo, al rescate de nuestra alegría humana. Esta es, seguramente, una de las bases de la revolución cotidiana y permanente.
La experiencia personal de quien vivió mayo del 68’ y de aquellas que continuaron resistiendo, fue una sucesión de intentos de realizar el deseo de ser libre en el cuerpo y en los pensamientos. Una lucha cotidiana para oponerse a la acomodación y a la seducción de la inserción bien comportada propuesta por el capitalismo.

Más difícil se vuelve vivir este sueño en el cotidiano de una relación amorosa, compartiendo el día-día con una compañera, donde las dos se amen, se deseen y puedan crear juntas.
Vivir esta situación solo puede suceder sobre una base de mucha sinceridad en la que exista la renovación compartida de esa revolución cotidiana y permanente. Solamente a partir de conversaciones constantes y solidarias fue posible progresar sobre este tema, a pesar de su complejidad. En un contexto de libertad se vuelve posible la convivencia con nuevos amores y permite a las personas envueltas en esta situación tomar un camino (o una transversal) más verdadera y más placentera.

Las dificultades son grandes. Del lado de quien está consciente que su compañera está enamorada/encantada por otra mujer, suceden muchas crisis de inseguridad - de inspiración hetero-patriarcal, aunque no por ello son menos dolorosas-. Una vez conseguido superar/convivir con ese sentimiento de dolor, la superación de la sensación de propiedad - que tampoco es nada simple - lleva a una libertación de los propios sentimientos.

Lo esencial para convivir con esta nueva situación, es hablarlo todo dentro de la relación. Ese papo de “solo contar cuando sea algo más serio” no funciona, es un engaño. En primer lugar, porque se está jugando con la capacidad de percepción y de conocimiento de la una por la otra:
Una -siento que ella está envuelta en otra relación, que le está gustando otra mujer, ¿será paranoia mía?... ¿Si yo le hablara, se va a sentir agredida?
Otra- ¿Tiene sentido hablar, si tal vez termina mañana?

¿Es posible anticipar o afirmar los rumbos de una relación abierta o cerrada? Creo que el primer paso, de todas las partes, es conocer la verdad. Es necesario que todo sea explícito, inclusive cuando implique “yo no sé lo que va a pasar a partir de ahora...”.

Comprendiendo y viviendo este proceso con una compañera comprometida con esta misma búsqueda, puede sentirse un profundo sentimiento de libertación. En una situación como esta los celos y la posesión pierden sentido (aunque sigan existiendo), permanece el miedo de “perder” que también es una posibilidad en una relación monogámica o cerrada. La posibilidad de esconder los sentimientos que una pueda tener por una tercera persona, también pierde sentido.

Reitero que es necesario tener mucho cuidado con la(s) persona(s) amada(s). ¿Vale la pena ser expuestas a situaciones diarias y frecuentes de división de privacidad? Es esencial preservar la intimidad y la particularidad de las relaciones. Creo que una convivencia constante puede exponer a la persona que está teniendo otras relaciones a un stress de intentar “ajustar” las cosas, y las otras dos a muchas oscilaciones por imaginar cosas que no son dichas, sentimientos que están siendo reprimidos. En suma, pienso que vivir relaciones paralelas no puede cortar el flujo de energía entre las personas que en ella participan.

Como vengo defendiendo desde el inicio, la forma de hacer el camino del desafío es muy subjetiva. Pero pienso que cada una debería buscar la manera de inserir sus propias particularidades e individualidades en este proceso. Una de las mías, es mantener mi paz que también es un elemento de creación.


Hasta donde nos llevaron nuestros diálogos...

La práctica, esta vez, me llevó a creer que no tiene el menor sentido perder sentimientos tan profundos, tan creativos y raros de encontrar, que puedan unir dos mujeres, ni ese deseo que sentimos cuando estamos bien. Tampoco hay necesidad de que cada una impida la realización de los más diversos impulsos creativos de la otra. Son relaciones diferentes, con personas diferentes. Es como si retirásemos un velo que nos separa de nuestra esencia y que finalmente pasásemos a vernos cara a cara viéndonos con todas nuestras dificultades y deseos. Finalmente, más humanas, más revolucionarias, con más ganas de transformar este mundo patriarcal, clasista y racista. Esto me llena de amor por mi compañera y me da ganas de ser entera y plena. Como dicen l@s existencialistas: vivir es carencia de ser.

Si la revolución social parece una meta tan distante, ella puede existir dentro de casa desde que no se pierda de vista su dimensión social. En realidad es solamente en la dialéctica individual / social que se puede construir un proceso revolucionario que sea permanente y representativo de los conflictos que fundamentan todos los movimientos sociales. Es la revolución del placer, de la creación y de la más profunda sinceridad.

Con todo esto, quiero dejar expreso, no pretendo escribir ningún manual a seguir sobre relaciones abiertas. Esta es una experiencia subjetiva (y política) que no tiene reglas, así como la sociedad que nosotras queremos crear y vivir desde ahora. Es parte de nuestra revolución cotidiana y libertaria.


Referencias:

Engels, F. (s.d.) El origen de la familia, la propiedad privada y el Estado. Ed. Progresso, Moscú.
Mészáros, I. (2002) Para além do capital. Ed. Boitempo/ Ed. UNICAMP, São Paulo.
Eco, U. (2003) O Nome da Rosa. Ed. O Globo, Rio de Janeiro/ Folha de São Paulo, São Paulo.








[1] Economista, integrante do espaço Mulheres Rebeldes e da Articulação de feministas Autônomas claricastilhos@yahoo.com.br

[2] O movimento anarquista já tratava do assunto sob o nome geral de amor livre. Essa questão está sempre presente, como durante maio de 68, chamarei aqui de relacionamentos abertos que tem muitos pontos em comum com a idéia de amor livre.
[3] Agradeço ao Sérgio Lulkin, amigo e ator, que está escrevendo um maravilhoso trabalho sobre o riso e me ajudou a encontrar esta citação.
[4] Este texto fue inicialmente escrito en portugués, la traducción corresponde a mariana pessah.

[5] Economista, integrante del espacio Mujeres Rebeldes y de la Articulación de Feministas Autónomas claricastilhos@yahoo.com.br

[6] El movimiento anarquista ya trataba el tema con el nombre general de amor libre, cuestión que está siempre presente como en mayo del 68’. Yo me referiré como relaciones abiertas que tiene muchos puntos en común con la idea libertaria.
[7] Agradezco a Sérgio Lulkin, amigo y actor que está escribiendo un maravilloso trabajo sobre la risa y me ayudó a encontrar esta citación.

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